Projecto | Ler Saramago | Terra do Pecado
Já disse que adoro as capas novas dos livros de José Saramago? Várias vezes. Infelizmente “Terra do Pecado” não teve direito a capa nova. Sabiam que o livro era para chamar-se “Viúva” mas a editora achou por bem alterar o título com a autorização do autor? Saramago explica tudo no inicio do livro. Pessoalmente, acho “Terra do Pecado” muito melhor. E ao contrário do que li por aí, tem tudo a ver com a história.
Quando comecei o desafio Ler Samarago sabia que estava perante a evolução narrativa do autor ao ler por ordem cronológica. A minha expectativa não era muito alta em relação à narrativa, mas sabia de antemão que seria uma boa história por ser escrita pelo meu autor preferido.
Maria Leonor fica viúva, com dois filhos e uma casa enorme para cuidar. Com empregados fiéis, amigos da família, ela vai lutar para ultrapassar a dor da perda do seu marido. Vai lutar contra o preconceito de recomeçar a sua vida numa terra onde as viúvas não podem dar continuidade à sua vida e manchar a honra da família. Numa terra onde os mortos são a justificação para parar de viver. A terra do pecado dita leis à sociedade onde o luto é obrigatório, os mortos merecem respeito e dar continuidade à vida é considerado um pecado. Sorrir é pecado. Viver é pecado.
Todos os personagens me pareceram bastante credíveis. Muito bem construídos.
A empregada Benedita vai ser bastante importante para este trama e ainda hoje me questiono em relação a algumas atitudes. Ficaram algumas coisas por responder em relação a ela. Aliás, tenho as minhas respostas mas sem certezas. O autor não é explícito. Benedita é a voz da sociedade hipócrita. Irritou-me imenso pelos julgamentos que ela faz à Maria Leonor.
A protagonista, Maria Leonor, é frágil e medrosa. Não gostei muito dela, incomodou-me várias atitudes. Sobretudo no final.
O meu personagem preferido é o médico Viegas. É interessante, dá ritmo à narrativa e à vida da Maria Leonor. Faz perguntas pertinentes, deixou-me a pensar várias vezes.
Acho a discussão deste livro muito interessante. Saramago não se aprofundou em relação aos temas mas não deixaram de ser importantes para o leitor questionar os seus princípios. Dei vários sorrisos ao longo desta leitura. Deu-me a sensação que Saramago usou a personagem do médico para dizer aquilo que pensa em relação à sociedade.
A narrativa é simples. Como li outros romances do autor, sei que houve uma enorme evolução ao longo do seu percurso. Contudo, adorei ler o primeiro romance de Saramago. Este livro tem a presença de todos os elementos ortográficos da narrativa, ao contrário dos alguns dos seus romances. É uma história simples, retrato fiel à nossa sociedade, com questões interessantes.
Alguns assuntos mereciam maior aprofundamento por parte do autor. Senti que foi um final pouco à altura do resto da história. Meio forçado.
A minha mãe ficou viúva com três filhos, há 18 anos. Nessa altura, foi alvo de críticas pela sociedade porque decidiu seguir com a sua vida e ser feliz. Enquanto lia este livro vi a minha mãe, vi aquele lado que os filhos esquecem que os pais têm, a vida amorosa, a necessidade de amar e ser amada. Mas ao contrário de Maria Leonor, a minha mãe foi mais corajosa.
Não gostei do final escolhido para esta história. Fui apanhada de surpresa e não estava nada, mesmo nada, à espera. O final podia ter servido para eu mudar a minha opinião em relação à protagonista mas não foi o caso, pelo contrário.
Quatro estrelas. Pela qualidade da narrativa e questões levantados.