RUANDA | A menina que sorria contas, Clemantine Wamariya
Editora Objectiva
Lançamento Setembro 2018
De todos os livros que já li para o projeto Do Quarto para o Mundo, este foi o que me trouxe mais conhecimento em relação à cultura do país em questão. Relatado por uma menina que sobreviveu ao genocídio do Ruanda, sendo um livro de não ficção, acaba por ter pormenores que mais nenhum outro livro tem. Clemantine mostra como se viu perante a guerra, como perdeu a vida que tinha e precisou de fugir do seu país para sobreviver. A Menina que Sorria Contas é um livro emocionante.
Sentia imensa curiosidade em relação a este episódio da história do Ruanda. Lembro-me de ver o filme Hotel Ruanda (2004) e ter ficado muito impressionada, conheces? Este livro acabou por ampliar o meu conhecimento. E é isto que eu mais amo na literatura, despertar para outras realidades. Se querem saber mais sobre o genocídio, este livro é perfeito.
O livro começa com um episódio muito emocionante, o encontro da Clemantine com os seus pais e irmãos durante um programa da Oprah. A realidade dela agora é os Estados Unidos da América, com a sua nova família. Como será que se sentiu?
"Sentia gratidão, sim. Oprah devolvera-me os meus pais. Mas também me sentia esmurrada no estômago, como se a minha vida fosse alguma espécie de perversa experiência psicologia: vamos ver até que ponto podemos deitar abaixo uma pessoa e quanto a podemos elevar a seguir, e depois vamos ver o que acontece!"
E há todo um debate sobre esta exposição, as perguntas das pessoas, a forma como é tratada. Como tentou, mais tarde, aproveitar para estar com a sua mãe, irem juntas a lugares muito bonitos como museus e restaurantes. Como as realidades acabam por se distanciar, aproximar e distanciar novamente. Como o passado, os horrores da guerra provocam dor e nos levam a questionar um milhão de coisas.
Como este livro fiquei a conhecer a realidade das raparigas nascidas no Ruanda. O cuidado que elas precisavam ter para não serem "estragadas" por um homem, para se manterem "limpas" até ao casamento. É chocante a forma humilhante como as mulheres são submetidas aos homens
"No Ruanda, quem é do sexo feminino tem um grande valor à nascença - não por quem é como individuo ou pela sua mente, mas pelo seu corpo. Por causa do seu corpo, quando uma rapariga casa, a família vai receber vacas."
Clemantine também fala de outras guerras. É citado várias vezes o autor Elie Wiesel, autor do livro Noite (ainda não li, mas preciso de ler), sobre o Holocausto. A forma como o livro a impressionou e releu vezes sem conta. Outras lutas, como o preconceito racial, através de Toni Morrison, Maya Angelou, James Baldwin.
"Mas a dor de Maya Angelou não era a minha dor. Ainda que me identificasse com a história da escravatura, ela não era a minha história. Não fora a América branca a causar as minhas feridas."
Em vários momento senti a sua revolta no tom da narrativa. O livro foi difícil de ler devido à violência, à crueldade descrita. A capacidade do Homem de destruir os seus é arrepiante. E apesar de estar longe de sentir a sua dor, a empatia causada entre mim e esta história acabou por me emocionar muito. Ainda hoje penso nela.
"Em 2004, quando saiu o filme Hotel Ruanda um aluno da minha turma perguntou-me se eu tinha tido medo durante a guerra. Foi o primeiro a fazer-me a pergunta directamente. Ofendi-me. Queres que te diga como me senti? Como te atreves a pedir-me que volte a esse lugar?... Comprendo que o medo e o fascínio pela morte fazem parte central da condição humana, mas não queria que me fizessem perguntas a esse respeito."
Sabiam que uma das coisas que os ruandeses perguntam quando acordam é "o que sonhaste esta noite?". Há tanto para aprender com este livro. Ao longo da leitura procurei mais informações, mais explicações para o inicio do genocídio e encontrei um vídeo curto bastaste explicativo.
Dos livros mais transparentes e sinceros, a representar na perfeição a realidade distante de um povo que pouco ou nada conhecemos. Recomendo muito. Faltam 192 países 192 escritoras para concluir este projeto.
Três palavras para este livro:
- Mortes
- Crueldade
- Cultura
Fiz uma sondagem para escolherem o próximo país. De forma muito renhida, Dinamarca acabou por ganhar, obrigada a todos os que me ajudaram a escolher. Estava de facto difícil. Quanto ao livro escolhido sei muito pouco sobre ele. Disseram-me que era muito bom e eu comprei para integrar este projeto. Espero que ainda estejam a acompanhar esta grande aventura.